sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

A parte final do artigo 30/3 CP é inconstitucional!

In Correio da Manhã, aqui:

http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?id=273291&idselect=10&idCanal=10&p=200

O procurador-geral da República (PGR) emitiu uma directiva onde recomenda aos magistrados do Ministério Público “particular cuidado” na avaliação dos pressupostos do crime continuado, figura jurídica que segundo o novo Código Penal pode [Discordo: isso seria inconstitucional. V. infra.] ser aplicada no crime contra as pessoas, como abusos sexuais, e que permite que vários crimes sejam punidos como um único.


“Há que reconhecer que a mera possibilidade de atenuação da punição em casos que poderiam ser punidos de acordo com as regras do concurso de crimes, justificará um particular cuidado na avaliação e valoração das circunstâncias”, alerta Pinto Monteiro.
O procurador, que recorda a “controvérsia” gerada pela alteração do artigo 30.º do Código Penal, aconselha os magistrados a absterem-se de invocar a figura do crime continuado quando não estejam “inequivocamente apurados” os pressupostos da ‘continuação criminosa’.
Recorde-se que a aplicação do crime continuado aos crimes eminentemente pessoais foi considerada, por alguns especialistas, como uma alteração à medida do processo Casa Pia. Esta é, aliás, uma das alterações que a Associação de Juízes pela Cidadania quer ver revogada, tendo para o efeito criado uma petição, que está disponível on-line. O desembargador Rui Rangel e o advogado José António Barreiros foram dois dos principais críticos da alteração penal, classificando-a como “ultrajante” e “escandalosa”. [E inconstitucional ;)]
A paternidade da norma não foi assumida, mas o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, que coordenou a reforma penal, garante ter sido contra esta solução. O Ministério da Justiça já prometeu divulgar as actas da Unidade de Missão, o que não aconteceu até ao momento. Ana Luísa Nascimento

Lembro que todo o discurso jurídico é valorativo.

A aplicação da figura do crime continuado a bens pessoais causa repugnância, dada a dignidade desses bens.

A Constituição da República Portuguesa consagra expressamente o princípio da dignidade da pessoa humana:

Artigo 1.º
(República Portuguesa)
Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana (...)

A figura do crime continuado aplicado a bens pessoais é, por esta perspectiva - a única possível, dado o valor hierárquico supremo da nossa Constituição - inconstitucional.

Todo o cidadão está obrigado a respeitar a Constituição - magistrados incluídos, dentro e fora do exercício das suas funções.

(Editado a 13/01/2007: chamaram-me a atenção para a última frase, que poderia ser lida com um sentido que não previ. Não se trata de nenhuma crítica aos magistrados, muito menos os referidos na notícia! Isto é um apelo a que, dentro e fora das suas funções, os magistrados - naturalmente, os que defenderem essa opinião - digam alto e bom som que esta norma é IN-CONS-TI-TU-CIO-NAL! Os portugueses estão fartos de nódoas no pano jurídico português! E é preciso gritar isto bem alto aos ouvidos do legislador, a ver se ele se emenda.)

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